«UMA VOZ (como um suspiro)
Pouco a pouco
O mundo volta a ser do pensamento.
Pouco a pouco,
Lento e suave
Como o voo
De uma ave
Que se cansa,
Regressa o mundo ao mundo.
MARIA (bem manifestamente agora Senhora da Noite e da Morte diz, soleníssima, tendo por fundo o firmamente estrelado)
Do eterno erro na eterna viagem,
O mais que saibas na alma que ousa
É sempre nome, sempre linguagem
O véu e a capa de uma outra cousa.
Nem que conheças de frente o Deus,
Nem que o eterno te dê a mão,
Vês a verdade, rompes os véus,
Tens mais caminho que a solidão.
Volta a meu seio, que não conhece
Enigma ou deuses porque os não vê,
Volta a meus braços, neles esquece
Isso que tudo só finge que é.
MARIA (agora cantando, sempre Senhora da Noite e da Morte, fazendo girar as estrelas)
O que pensando sofreu
Na loucura foi feliz.
Ah, vem comigo, que és meu.
Hei-de levar-te ao país
Do qual ninguém nada diz
E que ninguém concebeu.
Vem, dos teus olhos se esvaia
Bem e mal; e p'ra ti caia
Minha sombra sobre o mundo.
Triste que riu e chorou
E além do rir e chorar,
Por pensamentos passou...
Vem a mim que eu sei amar.»
Fernando Pessoa, Fausto
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