28.6.09

rubificação da tarde



na tarde
entreolhada com as mãos alucinadas
pela comburência do espaço aberto em prece
todo o universo se cumpriu entre duas lágrimas
tudo
a proferência do vazio absoluto desconexo
caído em desgraça pelo espanto dos pássaros derradeiros
toda a ausência
em panos de longe revestida de festa e suavidade
o corpo secreto do desejo feito rosa e perfume
do que não se cumpre nas rosas
toda a dor
na antecâmara de para sempre não ser mais que o vento
todas as horas de antes
nas veias do mar compactadas de sonolentas promissões
tudo
até o vítreo rubor da luz navegando-me os olhos com ardores de véspera
até isso deixo
na quietação da praia

3 comentários:

fas disse...

Lindíssimo.

rmf disse...

Para Além Doutro Oceano
(notas)

Num sentimento de febre de ser para além doutro oceano
Houve posições dum viver mais claro e mais límpido
E aparência duma cidade de seres
Não irreais mas lívidos de impossibilidade, consagrados em pureza e em nudez

Fui pórtico desta visão írrita e os sentimentos eram só desejo de os ter
A noção das coisas fora de si, tinha-as cada um adentro
Todos viviam na vida dos restantes
E a maneira de sentir estava no modo de se viver
Mas a forma daqueles rostos tinha a placidez do orvalho
A nudez era um silêncio de formas sem modo de ser
E houve pasmos de toda a realidade ser só isto
Mas a vida era a vida e só a vida

(…)


A’ memória de Alberto Caeiro

Fernando Pessoa
Ficções do Interlúdio
poemas publicados em vida

Um abraço amigo, Paulo.

Tão bela, e real, "a rubificação da tarde"; grande, como numa fotografia.

Oscilo, onde te reencontro,
numa barca no mar,
entre vagas de mar-chão ao sabor dos teus poemas.

Imensamente grato!

Paulo Feitais disse...

Soantes, tens sido a prova de que a fotografia nos permite contactar com a imensidade, do instante, do espaço que se abre perante nós quando estamos absortos na paisagem...
E Rui, recebo esse abraço, pressentindo que por aqui se faz a Frátria... :) E não há porto melhor para a nossa perdição do que a poesia...
:)